Um grupo de emigrantes portugueses entregou uma petição que pede uma lei eleitoral do século XXI. A comissão dos Negócios Estrangeiros vai analisar o documento e fazer um parecer conjunto entre PS e PSD.

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Pela primeira vez em anos, a comissão parlamentar de Negócios Estrangeiros decidiu esta terça-feira juntar dois partidos para, em conjunto, analisarem uma petição de emigrantes que pede uma lei eleitoral do século XXI.

Não sendo inéditos, os relatórios bipartidários são tão raros que, no fim da reunião, dois deputados brincaram dizendo “fez-se história!”. Na última legislatura, houve mais de 120 pareces e nenhum foi conjunto. Na actual, ainda só houve um, sobre refugiados. E assim, o documento da comissão a analisar a petição para simplificar a lei eleitoral vai ser feito pelos deputados Paulo Pisco (PS) e Carlos Alberto Gonçalves (PSD), o que pode permitir limar algumas divergências antes de o debate “subir” ao plenário.

Dos cinco milhões de emigrantes portugueses espalhados pelo mundo, só uma ínfima parte vota nas eleições portuguesas. Há apenas 300 mil recenseados e, desses, só 5% vota nas presidenciais (presencialmente) e 10% nas legislativas (por correspondência).

Muitos emigrantes não tentam votar, mas milhares querem e acabam por desistir quando esbarram na burocracia.

O movimento Também somos portugueses, com base em Londres, mobilizou 4246 pessoas e entregou há duas semanas uma petição à Assembleia da República. A 1.ª Comissão (de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias), que a recebeu, pediu agora uma opinião à 2.ª Comissão (dos Negócios Estrangeiros). Um dos pontos da agenda do dia era, portanto, identificar o autor do parecer sobre a petição. Mas o presidente, o socialista Sérgio Sousa Pinto, tinha uma ideia diferente. “É preciso uma cultura de compromisso”, disse, ao tentar ultrapassar as resistências iniciais para que o parecer fosse conjunto. “E não a afirmação de um ponto de vista que esmaga o outro.” “Esta questão é muito importante e exige consensos para se avançar com reforma do sistema eleitoral”, acabou por aceitar Paulo Pisco, seu colega de partido.

A proposta da petição é clara. “Estamos no século XXI, os portugueses tratam de todos os seus assuntos pela Internet. Portugal vangloria-se de ser um dos países da Europa com o maior número de serviços disponíveis online”, lê-se no texto da petição. “Por que teremos ainda leis do século passado para o recenseamento e voto dos emigrantes? Os emigrantes também são portugueses!”.

O movimento diz que os emigrantes enfrentam muitos obstáculos para se poderem recensear e votar, e propõem três medidas de simplificação, que evitam "deslocações desnecessárias aos consulados”: adoptar o recenseamento eleitoral automático quando o emigrante actualiza o cartão de cidadão com a nova morada do estrangeiro; o recenseamento digital ou via postal (em vez de presencial) e o voto electrónico.
Hoje, quando os emigrantes mudam a morada no cartão de cidadão, são automaticamente eliminados das listas eleitorais e têm de se recensear de novo, “como se deixassem de ser portugueses”. Em Portugal, o recenseamento é automático. O movimento contesta o recenseamento presencial, porque, argumenta, isso obriga os emigrantes a "perder dias de trabalho e fazer deslocações por vezes extremamente longas para se recensearem”. Diz que os emigrantes são obrigados a ir duas vezes aos consulados para terem um novo cartão do cidadão e argumentam que, nas últimas eleições, o voto postal dificultou ou impediu mesmo o voto no Brasil, Timor-Leste, Macau e Emirados Árabes Unidos, e que “votos foram para o lixo porque chegaram depois dos prazos!”.

No Verão passado, o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro, disse que estava a trabalhar para “aumentar radicalmente” a participação dos emigrantes nas eleições, e esta terça-feira o seu assessor Vítor Pinto disse ao PÚBLICO que "o trabalho que está a ser desenvolvido tendo em vista esse objectivo, mas ainda não há decisão".

O PSD propôs há pouco tempo propostas de alteração à lei eleitoral muito próximas das ideias da petição popular, como o voto electrónico; o recenseamento automático para os cidadãos que obtêm o cartão do cidadão na rede consular (com a garantia da possibilidade de recusa) e a eliminação automática da condição de recenseado no território nacional para quem tiver a residência principal no estrangeiro registada no sistema informático de gestão consular.

 

In Público