Há cem médicos que tiraram o curso na Venezuela à espera do reconhecimento das universidades portuguesas para poderem exercer.

PedroNeurologista

Associação de Médicos de Origem Luso-Venezuelana entregou petição a contestar burocracia.

São, pelo menos, metade portugueses, mas viveram e estudaram na Venezuela. Há uma centena de médicos luso-venezuelanos a quererem exercer em Portugal, que se dizem impedidos por uma questão burocrática: as universidades portuguesas ultrapassam o tempo previsto na lei para lhes reconhecerem os cursos, que não são equivalentes. O "Estado português que nos ajude a vermos reconhecidas as nossas habilitações e garanta o direito ao exercício da nossa profissão em Portugal, como portugueses que somos", escreveram numa petição, lançada neste ano, que querem ver discutida na Assembleia da República. A Direção-Geral do Ensino Superior, em resposta ao DN, admite que o número destes pedidos tem vindo a aumentar, mas que já agilizou este processo e que, neste momento, os cidadãos não precisam de apresentar tantos documentos.

As matérias dos cursos são diferentes e, por isso, uma licenciatura tirada na Universidade da Venezuela não é automaticamente reconhecida em Portugal. Há alguns países que têm protocolos com o nosso país, como Cuba, e não precisam de passar por este processo, o que não é o caso da Venezuela para já. No entanto, o país integra uma lista de nacionalidades em análise pela Comissão Nacional de Reconhecimento de Graus e Diplomas Estrangeiros com o objetivo de um eventual reconhecimento automático de alguns dos graus atribuídos por sistemas de ensino superior estrangeiros.

Por agora, a solução é aguardar, enquanto a ansiedade e a angústia crescem a quem teve de deixar o seu país por falta de condições de vida. Desde 2017, que milhares de venezuelanos saem às ruas, primeiro em protestos contra um regime político que cortou relações diplomáticas com países de que dependia para vender petróleo, depois por causa de uma inflação que disparou em flecha. Mais de 2,3 milhões de venezuelanos tentaram fugir da escassez aflitiva em que vivem e da insegurança do país. Pedro Mota (de 37 anos) formou-se em Medicina em 2008 e terminou a especialidade (neurologia), em 2013, na Universidade da Venezuela. É casado com uma portuguesa e tem uma filha de 16 anos. "Fomos roubados, enganados e recebi ameaças de sequestro da minha mulher e da minha filha. Foi no meio da angústia que decidimos vir para Portugal", conta.

Não foi a primeira opção, precisamente porque Pedro já tinha ouvido falar sobre o tempo que poderia levar o reconhecimento do seu curso em Portugal. Mas estava na altura da sua mulher voltar para junto da família. Chegaram a Portugal a 25 de agosto de 2019, Pedro Mota com um visto de residência válido por cinco anos e já com o processo de reconhecimento do grau iniciado, através do Portal da Direção-Geral do Ensino Superior (a 17 de julho de 2019). Um mês depois, recebeu a confirmação de que o seu pedido seria atribuído à Universidade de Coimbra e, em setembro, o estabelecimento de ensino superior aceitou a sua solicitação de reconhecimento e pediu o pagamento dos 500 euros obrigatórios neste processo.

"A 6 de dezembro recebi um e-mail da Universidade de Coimbra, em que me indicam que o meu pedido de reconhecimento estava em espera por causa de um novo regulamento", diz Pedro Mota. É um dos únicos dois profissionais que receberam uma resposta clara da DGES, segundo a Associação de Médicos de Origem Luso-Venezuelana. "Estamos todos a realizar atividades não relacionadas com medicina." Pedro trabalha numa fábrica de cerâmica, em Ílhavo, Aveiro.

In «Diário de Notícias»