ONU diz que mais de 1,5 milhões dos emigrantes estão na Europa. Com os 2,2 milhões emigrados e os residentes em território nacional, há mais de 12 milhões de portugueses.
O número de portugueses que estão emigrados pelo mundo fora é de 2 266 735, indicam as estimativas das Nações Unidas reunidas no relatório estatístico de 2017, divulgados neste mês, e em que é feita uma revisão dos dados que tinham sido compilados em 2015. Os emigrantes portugueses eram então estimados em 2,3 milhões. Hoje, as linhas gerais do relatório da emigração relativo ao ano de 2016 são divulgadas pelo coordenador científico do Observatório da Emigração, Rui Pena Pires, na presença do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva. A tendência é de diminuição do número de saídas do país, rondando agora as cem mil por ano, crescimento de população residente no exterior - de 1,8 milhões em 1990 para os 2,2 milhões atuais -, agora cada vez mais concentrada na Europa.
Se contabilizarmos a população nacional residente em Portugal (perto de dez milhões) com os emigrantes, a estimativa supera os 12 milhões de portugueses, excluindo lusodescendentes. Alargar o número à diáspora é mais complexo. A Federação Portuguesa de Futebol, no Euro 2016, teve a campanha "Não somos 11, somos 11 milhões", número que mereceu contestação da comunidade emigrante habituada a situar em 15 milhões, ainda que sem rigor. Até se pode recuar seis séculos, como fez o inglês Malyn Newitt no livro Emigration and the Sea: An Alternative History of Portugal and the Portuguese em que enaltece a diáspora portuguesa desde o século XV. "A diáspora é um conceito mais afetivo e identitário. São segundas e terceiras gerações, de quem nem se sabe muito bem a ligação ao país", diz Jorge Malheiros, geógrafo e investigador em migrações do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa.
Teresa Silva está na Suíça há 28 anos (29 em janeiro). Tinha 15 anos quando saiu de Chaves para ir tomar conta dos dois filhos de um casal português. Agora diz que a sua casa é naquele país.
Rui Pena Pires, diretor do Observatório da Emigração, disse ao DN que "ninguém sabe ao certo quantos somos na diáspora", mas aceita que entre a população nacional e emigrantes, os portugueses possam ser entre 12 e 12, 5 milhões. Sobre as estatísticas da ONU, afirma que confirmam os dados que o Observatório tem recolhido, mesmo com a correção em baixa do número total de emigrantes portugueses. "A diferença não é muito grande. Falamos de estimativas e a ONU usa uma matriz em que recolhe informações de todos os países, através do número de entradas. A margem de erro em alguns países é grande e daí a necessidade de revisão", explica.
Mesmo com esta revisão, as estimativas apresentam alguns dados que deixam dúvidas aos investigadores portugueses, como seja o caso da América Latina, em que indica uma subida. Tanto Rui Pena Pires como Jorge Malheiros duvidam muito deste cenário. "A emigração para o continente americano diminuiu e não há indicadores que possa ter crescido como indica a ONU. No Brasil não aumentou, pelo contrário, e na Venezuela diminuiu muito. Neste caso, atualmente nem há emigração", aponta Rui Pena Pires, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE-IUL. Entre Brasil, Venezuela, EUA e Canadá, a diminuição de portugueses é uma realidade. "As entradas são inferiores à mortalidade de emigrantes nesses países", revela.
A Europa é cada vez mais o destino dos portugueses, com França - onde vive a maior comunidade -, Reino Unido, Suíça e Alemanha a serem os países de destino principais. "Há um crescimento em Espanha e Bélgica, mas ainda ficam longe. Na Suíça há uma redução grande de entradas. Poderá ter que ver com o facto de, além da construção, empregar muitos emigrantes no setor do turismo e Portugal oferecer agora, nesse setor, mais emprego", aponta Rui Pena Pires.
A tendência global da emigração portuguesa é de estabilização. "O número de saídas reduziu e tende a estabilizar. O número de residentes no exterior irá sempre aumentar. Os regressos são poucos, muito inferiores às saídas", diz o coordenador do Observatório. A maioria dos emigrantes não tem muitas qualificações e será exagero falar em massiva saída de pessoas com habilitações superiores. "Os não licenciados ainda são maioritários na emigração. Em França, Portugal é o primeiro país de origem dos emigrantes, mas é apenas o décimo em número de licenciados, atrás da Turquia, por exemplo. As últimas estatísticas conhecidas do Reino Unido apontam para 30% dos portugueses com licenciatura. É óbvio que o número de licenciados aumentou muito e isso reflete-se na emigração mas não se pode dizer que seja dominante." Outra tendência é a diminuição dos emigrantes que procuram África. "Está a diminuir, com a situação em Angola a ter impacto. E tenderá a baixar ainda mais nos próximos tempos", considera Rui Pena Pires.
EUA e Arábia Saudita, países com mais emigrantes
O número de migrantes internacionais - a designação usada pela ONU - supera os 258 milhões. A maioria, cerca de 106 milhões, é originária da Ásia, enquanto os Estados Unidos da América lidera como a nação que mais emigrantes acolheu, à volta de 50 milhões. São dados que constam do relatório estatístico sobre emigração, em que se conclui que 20 países do mundo concentram 67% dos emigrantes.
A procura de novos países para residir e trabalhar está a subir. Em 2010 era estimado que fossem 220 milhões e agora são 258 milhões emigrantes. Os EUA estão no topo como país de acolhimento, enquanto a Arábia Saudita é o segundo, com mais de 12 milhões de emigrantes (a maioria da Ásia), com Alemanha e Rússia (também muitos asiáticos) a apresentarem números muito parecidos. Em quinto lugar surge o Reino Unido, com nove milhões.
"É normal que ocorra mais emigração. Temos um mundo mais interligado, em que os vínculos laborais são também mais precários. Para as migrações há hoje muito mais ferramentas, como os sistemas de transporte mais globais e mais baratos ou o domínio de línguas, o que facilita a mudança de país. A circulação de pessoas está estimulada e é provável que aconteça com mais frequência", afirma Jorge Malheiros, investigador em geografia humana. Contudo, alerta que há sinais contraditórios do ponto de vista político. "As restrições à mobilidade das pessoas estão a aumentar por iniciativa política. Há excesso de nacionalismo, fenómenos como o brexit."
A própria ONU reconhece que é difícil implementar uma política global de migrações. Dos cinco instrumentos legais que a organização de que António Guterres é secretário-geral procura implementar só 37 países os ratificaram. Isto numa época em que os refugiados têm um impacto grande nas migrações. O relatório da ONU aponta para mais de 25,9 milhões no mundo, com a Turquia a ser o país com mais refugiados, cerca de 3,1 milhões, seguido pela Jordânia com 2,9 milhões. "Regular bem estas migrações é uma história complicada. No mundo global atual está longe de ser conseguida", resume Jorge Malheiros.
Por isso, este investigador refere também a dificuldade em calcular os verdadeiros números da emigração. "Ninguém sabe quantos saem de um país, a estimativa é feita sempre pelas entradas. E os dados não estão atualizados, não saem todos ao mesmo tempo e há países que entregam dados desatualizados. Daí a necessidade de se fazerem atualizações, como a ONU faz."