O supermercado de Álvaro Oliveira já tem bacalhau e polvo e estão para chegar os bolos.

PaisdeGales

O empresário preparou as encomendas para que não falte nada ao Natal da comunidade portuguesa de Wrexham. Só não consegue preparar-se para o Brexit.

“Ninguém sabe ao certo como vai ser, a confusão que vai ser para um negócio pequeno. Vai ser difícil”.

De todos os portugueses com quem a Lusa falou em Wrexham, no País de Gales, Álvaro foi o que mostrou mais preocupação com as eleições britânicas que deverão determinar se o Brexit se concretiza mesmo até 31 de janeiro, como promete o primeiro-ministro, Boris Johnson.

Dono de um supermercado português nos arredores da cidade, que tem tudo o que uma boa mercearia teria em Portugal, o empresário teme o impacto das mudanças nas alfândegas, nos impostos, nos transportes e até no poder de compra.

“Se ele seguir mesmo para a frente com o Brexit, vai-nos trazer problemas, vai-nos trazer custos na importação, nos transportes, e a trabalheira que vai ser no princípio”, disse, sublinhando que a quase totalidade dos produtos que vende são importados de Portugal.

Além disso sente que o medo do investimento o impede de “alargar horizontes”.

Sobre o impacto nas vendas, Álvaro espera que os portugueses não se vão embora – “eu dependo dos portugueses, vendo 97 a 98% a portugueses”.

Se todos forem como a cliente Ana Barros, Álvaro não deverá ter problemas.

À conversa com outros portugueses no interior do supermercado, Ana mostrou-se descansada e sem planos de se mudar.

“Tenho a minha situação regularizada, tenho uma filha de 14 anos na escola... Um dia tenho de voltar, mas para já não”.

Apesar de não poderem votar nestas eleições, por não terem nacionalidade britânica, os portugueses vão ser afetados pelos seus resultados.

Até ao fim de 2020, têm de regularizar a sua situação, pedindo o estatuto de residente permanente (‘settled status’), se estiverem há pelo menos cinco anos consecutivos no Reino Unido, ou o título provisório (‘pre-settled status’), se estiverem no país há menos tempo.

Preocupada com a comunidade, Iolanda Viegas está a fazer campanha para sensibilizar os portugueses para a necessidade de regularização e ajudá-los no processo.

“É um processo que parece muito simples, mas não é. Se não falarem inglês, se não tiverem o telemóvel certo – o iPhone não dá...”, disse à Lusa enquanto fumava um cigarro eletrónico entre dois “fregueses”, como lhes chamou com carinho.

A trabalhar para o ‘Citizen’s Advice’, uma rede de instituições de caridade independentes em todo o Reino Unido que fornecem informações e conselhos gratuitos e confidenciais para ajudar as pessoas, Iolanda está cada dia num sítio diferente, dos quatro restaurantes portugueses que há em Wrexham, para tentar que a comunidade esteja preparada.

“Como não sabemos o que vai acontecer, quero que tenham tudo pronto com antecedência” disse a portuguesa, nascida em Moçambique e a viver há quase 20 anos na Grã-Bretanha, onde criou a Comunidade de Língua Portuguesa de Wrexham para apoiar os lusófonos que ali vivem.

Estimada em cerca de 2.000 pessoas, a comunidade portuguesa de Wrexham é constituída maioritariamente por trabalhadores das fábricas da região, alguns, poucos, nos escritórios das fábricas, e outros nas lojas, no atendimento aos clientes, disse à Lusa Jorge Vieira Szabo, há 18 anos no Reino Unido, onde preside à Associação da Cultura Portuguesa na Grã-Bretanha.

“Também há bastantes portugueses com iniciativa privada, cafés, supermercados, mecânicos e amas”, acrescentou, mostrando-se confiante de que o Brexit não vai trazer grandes problemas.

“À hora que a Grã-Bretanha sair da União Europeia há-de estar um barco a chegar a Dover e outro a chegar a Calais e eles não vão ficar no mar. A vida não vai parar”, exemplificou

O dono do café “Delicious Taste”, Francisco Engatado, é outro português sereno com o Brexit, assim como o padeiro Carlos Henriques, que já está há sete anos no Reino Unido.

Apesar de não poder votar, ‘O Bolas’ como também é conhecido, prefere os trabalhistas e ironiza que se o Brexit significar a expulsão dos estrangeiros então “os ingleses têm de se ir embora”, porque são os estrangeiros que “trabalham para os ingleses receberem subsídios”.

A única coisa que Carlos notou com o Brexit foi uma mudança a atitude dos britânicos: “A simpatia alterou-se um bocado”.

Já Álvaro Oliveira notou que as pessoas perderam poder de compra. “As coisas ficaram mais caras e o ordenado médio não subiu”. Além disso sente o peso da desvalorização da libra, mas isso não o faz desanimar.

Para já concentra-se em garantir que tudo está a postos para a época festiva que aí vem, porque o negócio “corre sempre bem nestas alturas em que as pessoas procuram a tradição”.

In «Bom Dia Europa»